Um dia após o nascimento da Laura fui torturada no hospital.
A tarde entrou uma enfermeira e mediu a GLICEMIA com aqueles aparelhos cujo resultado sai na hora, estava 42. Muita baixa no conceito médico. A enfermeira quis dar leite NAN, eu não deixei e expliquei que ela não tinha mamado bem e que amamentaria até que esse valor subisse.
E realmente ela não havia mamado bem, dado o tamanho da sua preguiça associado a várias idas e vindas com as enfermeiras para dar banho, ver médico, tomar vacina, fazer isso, agora aquilo...
Foi uma manhã muito agitada para a pequena e preguiçosa Laura.
Não tem glicemia que agüenta...
6h da tarde mudou a equipe de enfermagem...
Uma enfermeira (que adorava dizer que era pós graduada na Unicamp, sempre desconfie de quem impõe o local de formação como mais importante do que o ser) entrou no quarto dizendo coisas absurdas:
“o leite materno não tem glicose, tem que dar NAN por que se não a glicemia não vai subir” (essa é a campanha para amamentação materna)
“não pode tirar o leite no copinho devido à contaminação” (o NAN no copinho não contamina)
“com 10 anos de enfermagem não preciso medir para saber que sua filha esta com a glicemia baixa” (ela só estava dormindo e não queria acordar, não tremia ou qualquer outro sintoma, como ela sabia?)
A situação do profissional de saúde é tão grave que o próprio ministério da saúde, coloca no seu texto sobre alimentação infantil que seus profissionais estão despreparados, e que o discurso sobre aleitamento não condiz com a prática dentro dos hospitais.
“Cabe ao profissional de saúde identificar e compreender o processo do aleitamento materno e, a partir dessa compreensão, cuidar tanto da dupla mãe/bebê como de sua família. O profissional precisa estar preparado para prestar uma assistência eficaz, solidária, integral e contextualizada, que respeite o saber e a história de vida de cada mulher e que a ajude a superar medos, dificuldades e inseguranças. Apesar de a maioria dos profissionais de saúde considerar-se favorável ao aleitamento materno, muitas mulheres se mostram insatisfeitas com o tipo de apoio recebido”
Eu fiquei muito insatisfeita, não dá para acreditar, mas tive dúvidas como:
“meu leite não é o suficiente?”, “não alimenta?”, “o colostro não tem glicose?”, “ela não quer mamar?”
Logo eu, que levanto a bandeira da amamentação, que falo constantemente em sala de aula sobre isso, que amamentei a Maria até os 2 anos e 2 meses de vida, que sei da importância e da eficiência do leite materno, fiquei balançada...
E permiti que 20 ml de NAN fosse dado a Laura...( é um momento que você fica insegura pela vida do seu filho, e o profissional de saúde é muito importante, e a maioria deles são ruins)
Não é a toa que um estudo realizado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) (1981), em nove países ao redor do mundo durante o final dos anos 1970’s, tenha consistentemente encontrado que quanto maior a freqüência de contato das mães com o sistema de saúde , menos elas amamentaram.
Embora seja imprescindível reconhecer os esforços e o investimento feitos ao longo desses anos, retratados pelas campanhas de aleitamento, faz-se necessário admitir que seu papel tem sido enfraquecido pela falta de estrutura assistencial à mulher e seu filho nas questões da amamentação (SILVA,1996).
E faço questão de dizer que nenhuma dessas dúvidas faz sentido, que só há dois motivos para uma mãe não amamentar: ignorância (e isso é culpa do profissional de saúde que não orienta corretamente) e a vaidade (mães que não querem prejudicar seus seios não deviam ter filhos).
Imagina uma mãe com dor no seio, sangue, sacrifício, e ignorante sobre o assunto...Sai da maternidade com NAN embaixo do braço e agradecida a essa enfermeira metida a besta, pós graduada na Unicamp.
É essa a campanha de amamentação em hospitais e maternidades.
Então o que fazer?
As mães que estão tentando amamentar precisam de suporte (inclusive o emocional), bem como informações precisas, para se sentirem confiantes, no suporte oferecido pelos profissionais. Se o profissional de saúde realmente quer apoiar o aleitamento materno, ele precisa entender que tipo de apoio, informação e interação as mães desejam, precisa ou esperam dele.
Acredito que essa enfermeira não queria que eu ordenhasse por que talvez ela não saiba fazer e não teve humildade para dizer,...se você sabe ordenhar, espera que vou buscar um copinho esterilizado, luvas e mascara...
Foi minha mãe que também assustada com a glicemia da Laura, teve a idéia de dar leite no copinho, depois reforçada pela Gizelle, minha pediatra de confiança, que acordei as 4 da madrugada pedindo orientação. Da para acreditar que eu estava tirando meu leite escondido dentro do hospital, a vovó Zeca mentora e cúmplice.
Chegou uma hora que não pude esconder mais, então disse a enfermeira:
“Você não chamou um médico para avaliar minha filha, então liguei para minha pediatra que me orientou dar leite materno no copinho até ir embora daqui”
A mocinha entendida de leite mudou o discurso na hora... Elogiando a atitude...
(mas foi minha mãe que teve a idéia salvadora, e ela havia dito que contaminava).
Alias muitos estudos demonstram a necessidade de se fazer um trabalho com as avós, cuja geração não amamentou, mas são figuras importantes para a amamentação de suas filhas, o índice de desmame antes dos 6 meses diminuiria razoavelmente (TEIXEIRA, 2006).
Sinceramente acredito que é necessário repensar, negociar e mudar a cultura do não amamentar, como quebrar um paradigma equivocado sobre alimentação infantil;
Estudos demonstram que a amamentação cria vínculos, afetos, proteção, alem de nutrição adequada para a criança. Deveria ser dada a infância uma atenção especial, pois os distúrbios provocados aqui geram conseqüências graves nos adultos.
O ato de amamentar é um ato natural, milenar, sem custo, essencial para a vida dos seres humanos. Minimiza a fome, salva vidas e faz o indivíduo crescer não só biologicamente, como também emocionalmente. Dados sobre custo de alimentação demonstra que um bebe alimentado com leite materno gasta apenas $33,36 no primeiro ano de vida (BARBOSA, 2007), é quase o preço de um pacote de fraldas.
E ver o olhar do seu filho de agradecimento ao te encarar enquanto mama não tem preço, é sublime, divino e prova de um amor incondicional.
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